O foco central da etapa de documentar o ritual da investigação, ilustrado na figura 1, é a preparação do relatório da investigação. Este relatório é o documento que registra todo o ritual da investigação em todas as suas etapas: comunicação da ocorrência, ações imediatas adotadas, a constituição do grupo de investigação, o planejamento da investigação, a coleta de dados, a seleção do método de análise a organização dos dados, a análise propriamente dita, descrevendo como o evento ocorreu e quais foram as causas identificadas, as conclusões e as ações propostas devidamente avaliadas e priorizadas.

O relatório será utilizado para transmitir a outras pessoas da organização e, mesmo, partes interessadas externas, quando pertinente, o que aconteceu de fato, em termos descritivos e cronológicos, por que aconteceu, elencando os fatores de causa determinantes e o que pode ser feito para evitar a ocorrência de eventos similares no futuro.

Portanto, o relatório da investigação é o registro oficial da investigação e a qualidade dessa investigação, muitas vezes é avaliada a partir do seu relatório. Ao estruturar e redigir o relatório é importante considerar que os leitores do mesmo não participaram da investigação e pode ser mesmo alguém que não conheça o processo no qual o incidente ocorreu. Portanto, fotografias, desenhos, esquemas, fluxos e outras ilustrações podem ser úteis para a compreensão de ideias e situações que se queira apresentar, além de economizar descrições às vezes enfadonhas e cansativas para a leitura.

Lembre-se que um bom relatório de investigação não é avaliado apenas pelo seu número de páginas.

Figura 1 – Processo de documentar o ritual da investigação

Até que se obtenha um bom relatório, às vezes é necessário escrevê-lo várias vezes, razão pela qual é recomendável produzir uma minuta do mesmo e revisá-lo tantas vezes quanto for necessário, até que ele esteja pronto para ser apresentado à administração da empresa, a quem cabe aprová-lo formalmente.

Isto significa que a documentação do ritual da investigação é um processo interativo que pode ainda ser melhorado antes da aprovação final da administração. Dependendo da complexidade da investigação e de seus desdobramentos, pode ser útil uma revisão por parte de profissionais da área jurídica da empresa, assim como é essencial uma revisão gramatical, ortográfica e mesmo uma crítica na estrutura, abordagem e diagramação do mesmo.

Sabidamente, temos a tendência de nos “viciar” na leitura de algum documento que redigimos e que visitamos várias vezes, o que acontece com o relatório do ritual da investigação. Também é sabido que elaborar um relatório de investigação demanda tempo e dedicação e que, portanto, esta tarefa não pode ser deixada para ser feita na última hora. É preciso incluir no planejamento da investigação a tarefa de redação do relatório. Pensando nisso, sugerimos:

 

  • Definir a estrutura do relatório previamente na fase de planejamento da investigação;
  • Distribuir a tarefa de redação entre os membros do grupo de modo que cada membro tenha a responsabilidade de produzir partes do relatório;
  • Começar a redação assim que possível e nas etapas iniciais do ritual da investigação. Isto ajuda a não se esquecer de registrar fatos relevantes observados;
  • Concentrar em alguém a estruturação do documento, com base nas partes descritas pelos membros e o controle das revisões do documento, de modo a evitar perdas e retrabalho;
  • Assegurar que as descrições de parte do relatório de cada membro sejam compartilhadas com o grupo, pois isso ajuda na uniformização da abordagem e na conexão entre as descrições de cada membro;
  • Planejar a produção de ilustrações, figuras, fluxos e desenhos, pois isso toma tempo e pode atrasar a produção do relatório se esta tarefa for deixada para o final.
  • Atualmente, o meio eletrônico é a ferramenta utilizada para a edição de relatórios. Assim sendo, é fundamental que seja considerada a segurança da informação, mantendo cópias de back-up atualizadas das produções dos textos, desenhos, figuras e ilustrações.

 

documentar o ritual

Pode ser útil uma revisão por parte de profissionais da área jurídica da empresa, assim como é essencial uma revisão gramatical e ortográfica.

Uma estrutura comum em relatórios de investigação inclui:

 

  • Um sumário executivo: apresentação de um resumo da investigação não mais longo que uma página, indicando brevemente o que ocorreu, o que poderia ocorrer de mais sério, quais foram as ações imediatas adotadas, o método selecionado para a análise, as causas identificadas, que recomendações foram feitas e que ações foram indicadas com o respectivo resultado da análise de efetividade e de priorização.

 

  • Justificativa: descrever os motivos que justificam a investigação. Às vezes o evento investigado não teve consequências reais maiores, mas tinha o potencial de ter sido catastrófico e assim merece uma investigação mais profunda. Adicionalmente, pode-se aqui utilizar o potencial de severidade da ocorrência para justificar a investigação.

 

  • Sequência dos eventos: descreve a sequência cronológica dos eventos evitando os detalhes. Se necessário, detalhes devem ser indexados como anexos.

 

  • Consequências: apresenta a descrição das consequências do evento as quais podem incluir informações sobre pessoas lesionadas, impacto ambiental, interrupção e perda de produção, custos de reparos ambientais, a perda de produção, de reparos a danos físicos em equipamentos e instalações, referências a despesas médicas, despesas com seguros, custos judiciais, custos trabalhistas etc.

 

  • O método de investigação e as causas identificadas: justificando a escolha do método de análise selecionado e apresentando as causas imediatas, as contribuintes e as causas fundamentais ou causas raiz devidamente justificadas e fundamentadas pelas evidências coletadas.

 

  • Conclusões e ações propostas: apresentar as conclusões, as ações de controle propostas devidamente classificadas de acordo com a hierarquia de controle, juntamente com a análise de efetividade e a análise de priorização.

 

  • Agradecimentos: sempre que existirem fatos que justifiquem, é importante registrar o agradecimento do grupo de investigação, reconhecendo pessoas ou grupos de pessoas que tenham de fato dado contribuição relevante durante o ritual da investigação.

 

  • Anexos: nos anexos devem ser inseridas informações pertinentes coletadas e que deram suporte à análise e às conclusões como desenhos, fluxos, cálculos, imagens, diagramas de análise de causas, devidamente classificados tais como:
  • Anexo A – Legislação e Padrões de Segurança
  • Anexo B – Fluxograma do processo
  • Anexo C – Grupo de Investigação
  • Anexo D – Lista de evidências físicas
  • Anexo E – Lista de entrevistas de testemunhas
  • Anexo F – Lista de evidências documentais
  • Anexo G – Linha do tempo do evento
  • Anexo H– Lista de imagens
  • Anexo I – Diagrama de análise de causas
  • Anexo J – Outros

Uma vez aprovado o relatório o mesmo deve ser enviado para as partes interessadas tanto internas quanto externas, quando pertinente. Nestes casos, algumas organizações têm como prática a produção de edições especificas de relatórios de investigação para públicos específicos, sem perda da informação fundamental do que ocorreu, como ocorreu, quais foram os fatores determinantes da ocorrência, as recomendações e ações definidas para evitar a recorrência ou uma combinação dessas informações de acordo com o propósito e o destinatário.

 

Não é incomum que a etapa de aprovação do relatório seja antecipada por uma apresentação do seu conteúdo com uso de multimídia. Neste caso, a apresentação também precisa ser preparada e ser produzida com objetividade. O sumário do relatório da investigação do incidente pode ser um bom guia para a preparação da apresentação.

 

Invariavelmente, todo incidente tem potencial para nos ensinar lições o que denominamos “aprender com os incidentes”. O primeiro nível de aprendizado é o aprendizado local, isto é, na unidade ou processo no qual o evento indesejado aconteceu. Assim sendo, um sumário das lições aprendidas precisa ser preparado para disseminação local, às vezes regionais ou mesmo abrangendo outras unidades além-continente. Na prática, este aprendizado começa quando o evento acontece, através do comunicado para todas as pessoas do ocorrido e é concluído quando termina o ritual da investigação, comunicando de maneira formal às pessoas da organização as lições aprendidas com a ocorrência, através das conclusões do ritual da investigação do mesmo.

Em se tratando de um ritual e considerando que as ações do aprendizado para com o incidente deve ser registrada, observe os documentos e registros pertinentes a esta etapa, indicados na figura 1.

No próximo artigo abordaremos a etapa 9, a última etapa do ritual de aprendizado para com o incidente, que aborda o acompanhamento das ações propostas para evitar recorrência em termos de execução física e efetividade da ação.

Autor : Reginaldo Pedreira Lapa
Engenheiro de Minas e de Segurança do Trabalho

Fonte: Lapa, Reginaldo Pedreira. Investigação e Análise de Incidentes, Editora Edicon, São Paulo, 2011

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